sábado, 5 de novembro de 2016

PROCURA E ENCONTRARÁS

Tom Hanks
Há dias, semanas, meses ou anos vividos numa voragem, na insaciabilidade de Cronos. Isabel II chamou de annus horribilis o ano do divórcio dos seus filhos. Outras pessoas encontram tal estigma no ciclo das doenças intermináveis, mesmo se curáveis, nos desgostos de amor, na depressão. Todavia, não se olhe o turbilhão tão só pelo decurso negativo. O amor - pelos filhos, pelos cônjuges, por namorados ou namoradas, pela terra, o trabalho ou a pátria -, pode ter o mesmo ritmo gravitacional. Tem é um sabor diferente, igualmente fascinante.
Nos últimos dias uma série de coincidências em cadeia levou-me ao encontro improvável do esotérico e da espiritualidade. Não me esquivo. Fascina-me, inebria-me e quase me colhe. Mas o meu mundo não é deste reino. Fosse porque a Helena Madeira, diz-se alquimista, apresentou o seu livro de poesia focada no universo alquímico e seus mistérios, nos estudos herméticos, onde se fala das mil histórias de pessoas famosas na transmutação dos metais, cada uma na procura do seu Graal, da felicidade espiritual, através da meditação. E citou-me Flamel e a Pedra Filosofal, Paracelso, grão mestre templário, combatente dos princípios obscuros da medicina do seu tempo, Roger Bacon, filósofo, e o seu livro escrito no cárcere Tesouro Alquímico sobre os princípios da alquimia, Nostradamus, Newton e Cagliostro, alquimistas famosos.
Procura e encontrarás, de Jesús
Fosse porque o Facebook repassou sei lá quantas vezes o Monte de San Michel e as suas raízes esotéricas, firmadas nos mistérios templários, chegados até D. Diniz, fundador e grão mestre da Ordem de Cristo. 
E por este rio acima continuaram os acasos, quais conversas como as das paixões, por Delfos, de cujo oráculo se avista Corinto e o mar das oliveiras, estendido até ao mar, por Santiago de Compostela e quejandos lugares, belos e supostamente mágicos. Vários autores fixaram-se nas pirâmides do Egipto, na forma como as construíram, nas histórias ocultas dos faraós, na indestrutibilidade dos símbolos, os enigmas neles contidos, a sua extrapolação para a vida dos homens.
Alquimia
Agustina Bessa Luís, citada por Lemos da Costa, é muito assertiva e positiva a propósito da simbologia:
«O símbolo tornava inteligível a lógica do conjunto e o símbolo perdeu os seus efeitos, definitivamente. 
Mas existe, e existirá sempre, uma co-determinação comum; e portanto um projecto de linguagem que escapa às garantias da razão. O homem transcende o símbolo porque o símbolo era só um meio de pensar o mundo efectivo.  Assistimos, na actualidade, ao arrasar de todos os símbolos – da família, da moral, da pátria e do deus de santuário».
E eis meus meninos a levarem-me a ver Inferno, o último filme de Ron Howard, inspirado no livro Deuses e Demónios de Don Brown, uma peregrinação vertiginosa pelas profundezas ou na exuberância estética das faces visíveis, das cidades de Veneza, Florença e Istambul, três das minhas cidades favoritas Todo o simbólico do Inferno de Alessandro de Botticelli, por muitos autores considerado a ilustração do Inferno de Dante Alighieri (primeira parte da Divina Comédia), confunde-se com os dons da cura de males físicos (ou do juízo), segredos inscritos em lápides mortuárias, quadros e subterrâneos das catedrais e palácios daquelas cidades.
Alguém como eu, com as suas crenças moderadas, e uma inclinação científica para a progressiva materialidade do espírito, não deixa mesmo assim de se impressionar com esta vertigem mítica e mística de perscrutar o nunca visto e sempre procurado. Procura e encontrarás, escreveu Botticelli na sua pintura, acme deste filme. «Pede, e ser-te-á dado; Procura, e encontrarás; Bate, e abrir-se-á a porta para ti», prédica atribuída por Mateus a Jesus.
Henrique Pinto

05 de Novembro 2016
Quadro O Inferno, de Botticelli

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